Publicação traz o urgente debate sobre o direito à água e à saúde

Publicação traz o urgente debate sobre o direito à água e à saúde

Na “Revista de Direito Sanitário”, pesquisadores tratam da questão hídrica do ponto de vista da política e da democracia

Barragem – Foto: 95839 via Pixabay / CC0

A seção Temas em Debate da Revista de Direito Sanitário trata do direito à água e à saúde públicas, apresentando três artigos, sendo dois sobre a fluoretação da água e o terceiro sobre recursos hídricos. Wladimir António Ribeiro apresenta o tema a partir de um ponto que considera comum nos textos: a democracia “ou a política como mediadora dos conflitos sociais por meio do direito e de si mesma“. Segundo o autor, os artigos mostram aspectos dos conflitos sociais de nosso tempo, em que o direito não se mostra como mediador eficiente das relações sociais e, sobretudo, a população mais carente não conta com a real aplicação dos direitos que a lei estabelece.

O primeiro artigo apresentado analisa a ausência de fundamentos dos projetos de lei que pretendem revogar a Lei Federal n. 6.050/1974. Essa lei “dispõe sobre a fluoretação da água em sistemas de abastecimento quando existir estação de tratamento“. Nesse contexto, Ribeiro ressalta a aparente contradição dos três autores, pois, se por um lado, afirmam ser preciso que os legisladores estudem melhor o assunto, por outro lado afirmam que tais legisladores sabem o que fazem, “mas possuem posições […] cujas motivações implicam a ocultação dos interesses subjacentes à iniciativa parlamentar”. Para Ribeiro, os projetos de lei “utilizaram a falsa informação de que o flúor, ao invés de benéfico, seria prejudicial à saúde, para infundir o medo e tentar revogar a Lei da Fluoretação, de 1974 – que é um dos mais importantes avanços da saúde pública brasileira“.Foto: ATDSPHOTO via Pixabay / CC0

O segundo artigo trata da fluoretação da água de abastecimento público e a efetivação do direito à saúde, ressaltando que o tema não deve ser considerado “mera obrigação do poder público, prevista em lei federal, mas de um direito subjetivo das populações, derivado de seu direito de ter acesso à água“. Salienta-se que a Administração Pública, que deveria prover os serviços públicos de abastecimento de água potável, ora não os viabiliza, ora deixa de fornecer água potável porque não conta com a fluoretação. Pensando nas soluções possíveis, não se nega o aspecto político do problema, entendendo que “a judicialização como medida de buscar uma efetivação da fluoretação pode ser bem fundamentada para o contexto brasileiro”.

O terceiro artigo trata da gestão dos recursos hídricos, analisando os instrumentos legais, a participação social e a forma de resolução dos conflitos em relação ao assunto. Segundo Ribeiro, os textos mostram, nas entrelinhas, que a força do poder econômico interfere nos diálogos possíveis com a população, na medida em que se apropria dos recursos hídricos destinados aos mais necessitados. O artigo seria uma antevisão dos acontecimentos de Correntina, na Bahia: “ante a violência da captação de água por uma empresa do agronegócio que, praticamente, consumia toda a água disponível, houve também a violenta reação da população, a seguir organizada na forma de protestos pacíficos“.

Foto: Agzam via Pixabay / CC0

A apresentação dos três artigos mostra que “o direito justo depende da política produzida pelo debate franco e aberto, que inclua os diversos segmentos sociais“, e a grande questão que se delineia é a de como construir “formas de consensos sociais e de solução de conflitos“. O trabalho conclui com a reflexão do filósofo italiano Giorgio Agamben: “Verdadeiramente política é, pelo contrário, só aquela ação que corta o nexo entre violência e direito”.


Wladimir António Ribeiro – Universidade de Coimbra. Coimbra, Portugal.
Por Redação Jornal USP