Brasil pode ter 17% do PIB comprometido só com aposentadorias em 30 anos

Por Jalila Arabi

Em pouco mais de 30 anos, o Brasil poderá ter 17% do seu Produto Interno Bruto (PIB) voltados somente para pagamentos de aposentadorias. A estimativa é de um relatório divulgado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) na última terça-feira (05), que mostra que o Brasil será o País com o maior gasto no setor de todo o grupo com as maiores economias do mundo mais a União Europeia (G20), se permanecer com o atual sistema previdenciário.

O relatório comparou o desempenho de 43 países e o Brasil registrou a taxa mais alta. Segundo a OCDE, a média de percentual para essa finalidade até 2050 deveria girar em torno de 9,2%. Hoje, o Brasil já tem 9,1% de todas as riquezas geradas por aqui para pagar aposentados e pensionistas.

O especialista em finanças Marcos Melo acredita que essa projeção de 17% do PIB seja apenas uma estimativa, mas faz um alerta. "É muito importante observar a tendência desses números. Se continuar como está, de fato, o gasto com previdência no Brasil deverá absorver uma proporção muito grande dos gastos."

O resultado médio dos países da Organização com gastos previdenciários fica em torno de 8,1%. A Argentina, que hoje gasta 7,8% no setor, deverá passar para 10,4% em 2050 – média bem abaixo da esperada para o Brasil. Segundo o relatório, alguns países que realizaram reformas na Previdência deverão ter o percentual do PIB mais baixo, como é o caso da França, que tem expectativa de passar de 15% para 13%.

"Nossa previdência hoje consome uma quantidade absurda de recursos do Governo e nós ainda somos um País jovem. A nossa transição demográfica será muito acelerada. O que a França fez em 100 anos nós faremos em 20 anos", afirma o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE-FGV) Bruno Ottoni.

Segundo os especialistas, o envelhecimento da população é positivo, devido às conquistas sociais, mas também pode ser um fator preocupante. Marcos Melo afirma que o sistema atual está montado com base no envelhecimento de 30 anos atrás. "Houve um avanço social no Brasil nos últimos anos. Por outro lado, a forma como o sistema da Previdência hoje está montado não é sustentável em longo prazo."


Brasil idoso
O Brasil está cada vez mais idoso, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A expectativa de vida do brasileiro subiu para 75,8 anos em 2016 – em 2015, era de 75,2. O número de idosos com 60 anos ou mais também cresceu em 2016, 16% a mais do que em 2012. "Todas as vezes que existe um aumento na esperança de vida da população, o sistema de Previdência tem que ser revisto", afirma o economista e membro do Conselho Regional de Economia Newton Marques.

De acordo com o relatório da OCDE, outra taxa que deve subir em alguns anos é a de dependência de idosos. O indicador calcula que, em 2075, o Brasil deve ter 62,3 idosos para cada 100 pessoas com idade de trabalhar (20 a 64 anos). A média dos demais países é passar de 25 para 55,6 pessoas com 65 anos ou mais.

"A gente tem uma regra que permite as pessoas se aposentarem muito cedo com benefícios muito elevados. Logo, quando a gente vê a participação da população idosa que os outros países têm, os nossos gastos em relação ao PIB vão ser maior", afirma o também pesquisador do IBRE-FGV Fernando de Holanda Barbosa Filho. Ele compara a aposentadoria brasileira com a de outros países. A taxa de reposição do benefício, conhecida como aposentadoria integral, não existe em outros países, somente no Brasil. A média dos países da OCDE dessa taxa é de 59%. Na França, a taxa é 69%. No Brasil, é de 82%.

O Governo está prestes a aprovar uma reforma no setor previdenciário. Até o momento, as discussões indicam que o texto deve entrar na pauta do plenário na segunda semana de dezembro. Porém, o Governo ainda está "contando voto a voto", como afirmou o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Para ser aprovada, a reforma precisa passar por dois turnos de votação e ter 308 votos favoráveis. "Quão mais rigorosa for a reforma, quão mais profunda for essa reforma, menor vai ser esse gasto com aposentadoria", aposta Fernando de Holanda Filho.

Uma das medidas propostas por essa reforma é a instituição de uma idade mínima para aposentadoria, sendo 65 anos para os homens e 62 para as mulheres. Outro ponto era modificar o tempo de contribuição de 15 para 25 anos, mas pela forte repercussão a medida foi alterada. "As pessoas estão considerando a previdência como um prêmio. 'Ah, eu vou trabalhar até os meus 55 anos, porque depois disso eu não vou mais trabalhar e vou receber.' Mas com 55, 60 anos você ainda está com grande produtividade hoje em dia. Previdência não é prêmio", critica Melo.

Cautela

O relatório da OCDE destaca a importância de se fazer reforma no sistema dos países, porém ressalta que "realizar reforma com pressa pode gerar efeitos negativos" do ponto de vista macroeconômico, pois "tende a amplificar ciclos econômicos, acrescentando sofrimento em tempos já difíceis."

"Acho que nós temos que fazer uma discussão muito mais ampla sobre o assunto", defende Newton Marques. Para ele, a reforma é necessária, sim, mas não pode ser analisada isoladamente. Já para Marcos Melo, mudar o sistema previdenciário é uma decisão. "É uma questão de escolha. Se você pretende fazer com que a arrecadação tributária e da previdência aumentem a proporção para poder pagar os aposentados, a gente precisa fazer uma escolha. Não vai ter dinheiro para todo mundo, então parte dos serviços públicos vai ter que sofrer com a redução de gastos."